A Associação Nacional de Farmácias (ANF) decidiu que as farmácias dariam aos doentes a possibilidade de escolherem, dentro da mesma substância activa, dose e forma farmacêutica prescrita pelo médico, o medicamento mais barato, mantendo a comparticipação.
Isto pareceria interessante, não fosse a lei muito clara a este respeito, quando define que a substituição de genéricos apenas é possível mediante a autorização do prescritor e com a concordância do utente.
Ora, talvez o cumprimento da lei pudesse resolver estes equívocos, pois é a mesma portaria que estipula as condições em que é permitido ao farmacêutico a substituição de um medicamento genérico, que define também a obrigatoriedade da prescrição médica ser efectuada por princípio activo, ou Denominação Comum Internacional (DCI), um pressuposto que não está presentemente instituído entre a classe médica portuguesa.
De equívoco em equívoco, temos a ANF a substituir-se à Ordem dos Farmacêuticos (OF), assumindo que “os farmacêuticos, enquanto especialistas do medicamento, conscientes das suas responsabilidades, não querem assistir à degradação da qualidade dos serviços prestados às populações. Nesse sentido, dão aos utentes a liberdade de optarem por um medicamento genérico, dentro do mesmo princípio activo, informando-os sobre as diferenças de preços.”
Mas não é isto que se extrai da leitura dos seus estatutos, onde se estipula a obrigatoriedade de “dispensar ao doente o medicamento em cumprimento da prescrição médica ou exercer a escolha que os seus conhecimentos permitem e que melhor satisfaça as relações beneficio/risco e beneficio/custo”, e cujo incumprimento é considerado infracção disciplinar.
O último dos equívocos acaba por ser algo que passará, certamente, despercebido à maior parte das pessoas. É que esta magnânima campanha da ANF termina dizendo o que deve, mas por quem não pode, “aconselhe-se com o seu farmacêutico”.
Perante o que a seguir se transcreve do site da ANF, os equívocos só podem ser considerados deliberados, senão, vejamos: “Um estudo qualitativo sobre a responsabilidade social no sector das farmácias, realizado por investigadores do ISCTE, em 2007, por solicitação da OF, concluiu que a actividade das farmácias portuguesas está orientada para a promoção da saúde e não tanto para a mera dispensa de medicamentos.”
Por menos que isto, os SMAS de Oeiras e Amadora foram alvo de um processo instaurado pela Associação Portuguesa dos Industriais de Águas Minerais Naturais e de Nascente (APIAM) junto do Instituto Civil da Autodisciplina da Publicidade (ICAP), que classificou uma campanha de apelo ao consumo da água da torneira como uma acção enganosa, por estar em causa uma comparação (!) que desrespeita o principio da veracidade (!).
Ainda que a terminologia possa não ser a mais adequada, a atitude da ANF pode prefigurar-se, neste caso, como uma prática de abuso de poder, ou, valendo-me dos conhecimentos que uma acérrima troca de argumentos com o IPAC me proporcionou, eu diria que a publicidade não deve abusar da confiança nem explorar a falta de experiência ou de conhecimentos do destinatário e deve proscrever qualquer referência, directa ou indirecta, que possa denegrir qualquer pessoa, actividade, profissão, ou serviço, ridicularizando-os ou desrespeitando-os.
Há Farmácias e há Farmacêuticos…descubra as diferenças! Por alguma razão, desde 2007 todas as pessoas singulares e sociedades comerciais podem aceder à propriedade de farmácias. E, depois, os farmacêuticos é que são comerciantes?
in Jornal de Oeiras, 7 abr./09
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